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quarta-feira, 6 de abril de 2011

O que Lola quer, Lola consegue

Você viu Moulin Rouge? Esqueça!
Gostou de Cisne Negro? Brincadeira de criança...
Agora a conversa é séria.
Você está diante de Lola Montès e ela só faz o que quer.


 De tempos em tempos somos confrontados com verdadeiras forças da natureza. Pessoas que não seguem regras, divertem-se, na verdade, em ignorá-las; que fazem o que lhe vem a cabeça; que dizem o que sentem e pensam; que quebram tabus; e, consequentemente, semeiam amor e ódio; admiração e repulsa por onde passam.
Há uma semana tomei conhecimento dessa mulher, nascida Eliza Rosanna Gilbert, em alguma data entre 23 de junho de 1818 e 17 de fevereiro de 1821. Mais conhecida pelo seu nome artístico, Lola Montès, era irlandesa, mas se apresentava como dançarina exótica espanhola. Conseguiu encantar homens influentes na aristocracia e no meio artístico europeu. E protagonizou escândalos notórios em sua época. Obviamente, ela é mais lembrada por isso e não por sua dança.
 Eu, que particularmente, sempre admirei pessoas como Lola, talvez por não lidar bem com normas e convenções impostas por sistemas e autoridades caducas ou, simplesmente, porque é divertido. Gostaria que ela fosse lembrada por sua personalidade apaixonante, completamente impulsiva e hipnótica. 

Amelia Mary Earhart, Marie Curie, Leila Diniz, Elis Regina, Lola Montès... artes, ciência, política, costumes... Será que alguma delas teve consciência do seu papel para ajudar a quebrar padrões? Elas foram mulheres, como qualquer outra mulher, com seus problemas e inseguranças. Entretanto, definitivamente, não eram mulheres comuns! Foram capazes de atrair os olhares de todos, vencer preconceitos, jogar na cara de quem quisesse (e quem não quisesse também!) suas opiniões e seu modo de vida. Despertaram paixões, no sentido original da palavra. 

Nesse ponto, não sei se estou mais encantada com o filme ou com a própria Lola. Provavelmente os dois...

Sobre a película de Max Ophüls, posso afirmar que é um deleite sensorial. As cores, os sons, a fotografia quase palpável, a câmera que te faz praticamete um voyer de Lola em sua trajetória e a restauração inacreditável que foi feita no filme, são enlouquecedores.
A história passa rapidamente pela infância de Lola, concentrando-se no período que vai de seu casamento até a abdicação de Ludwig I da Bavária, o mais poderoso de seus amantes, que a tornou Condessa de Landsfeld. Mas o que me ganhou, logo de cara, foi a opção narrativa do diretor. Ele escolhe mostrar a vida de Lola Montès por meio de um show circense. Não como os de hoje em dia, mas mais parecido com os teatros de variedades do século XIX. Com o que tinham de mais bonito e mais bizarro. Nada diferente da própria protagonista.
Assim, alternam-se o circo, com flashes da vida da dançarina. Muita coisa real, um pouco de ficção... E, o mais interessante, os momentos de maior angústia e sofrimento são sentidos no circo, no ambiente "ficcional", quando Lola aparece exposta, ao sabor da platéia, doente, persistente, frágil, resignada, adorável...
Considero acertadíssima também, a opção de não chafurdar na decadência da mulher por trás da artista, nem em explorar seus últimos dias; deixando-nos a imagem de quem, num mundo masculino, conseguiu sobreviver por si, muito tempo sem marido, sendo dançarina exótica e escolhendo seus amantes. Como bem dito no filme "ela fazia tudo aquilo que qualquer mulher gostaria de fazer e não tinha coragem". E foi isso o que Ophüls conseguiu gravar para sempre de forma magistral.

Por fim, o que me deixou mais estarrecida foi ler, na introdução do filme, que este foi um estrondoso desastre de bilheteria e que, depois de tanto tempo, foi redescoberto e devolvido aos amantes das artes:


"Lançado em Paris em 23 de dezembro de 1955, 'Lola Montès', de Max Ophüls,  causou um escândalo sem precedente. Diante do fracasso comercial do filme, os produtores cortaram cenas, traduziram para o francês parte dos diálogos em alemão e remixaram o som. No final de 1956, contra a vontade de Ophüls, o filme sofreu novos cortes, sendo remontado cronologicamente.
Em 1968, o produtor Pierre Braunberger  comprou os direitos do filme e lançou uma versão próxima da original. Em 2008, graças à tecnologia digital, a Cinemateca Francesa pôde lançar  uma versão totalmente restaurada, fiel às intenções de Ophüls, com as cores, o som e o formato idealizados originalmente.''


É de escorrer uma lágrima ler isso. Imaginar que poderiam ter dilacerado, remontado e desrespeitado o diretor dessa forma. Mas os deuses do cinema deram uma resposta à altura, com essa versão belíssima da Cinemateca Francesa.
Para ver o filme, clique aqui.

Um comentário:

  1. Só um filme apaixonante pra gerar um post apaixonado assim. Como sempre adoro seu jeitio de escrever.

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